segunda-feira, 9 de abril de 2012

Texto "As coisas podem mudar" (Caso Professora Ana)

Estamos mais uma vez aqui com o dilema da professora Ana....mas ela está melhorando aos poucos...vamos conferir pessoal...


AS COISAS PODEM MUDAR

Ana é uma professora que tem empenhado-se cada vez mais para que sua sala de aula configure-se de fato em um ambiente alfabetizador, num contexto de letramento. Como não tem muitos recursos e as condições da sua escola são precárias, tem precisado da ajuda de muitas pessoas. Sua relação com as crianças, seu empenho em refletir sobre a própria prática como professoras e algumas mudanças que vem realizando no trabalho pedagógico, segundo ela, são frutos do estudo que vem fazendo tanto do Referencial Curricular de Educação Infantil quanto dos Parâmetros Curriculares de 1ª a 4ª série. Ela diz que esses são praticamente os únicos textos de formação existentes na escola e que o estudo que vem fazendo deles tem favorecido o desenvolvimento de sua competência de leitura e escrita, ajudando-a a colocar-se cada vez mais na condição de usuária da escrita.
Veja como hoje a professora Ana organiza o espaço da sala de aula e algumas propostas de uso da escrita para criar um verdadeiro ambiente alfabetizador.
A sala é mobiliada com carteiras móveis reunidas quase sempre em grupos de quatro - às vezes em dupla e, esporadicamente, separados uma das outras. Nas paredes há dois murais doados pelos pais das crianças, após uma solicitação feita na primeira reunião bimestral, ocasião em que Ana enfatizou a importância que um mural de classe pode ter para documentar o trabalho desenvolvido e para expor a produção das crianças o que, indiretamente, contribui para o seu processo de aprendizagem.
Num dos murais estão organizados vários cartazes sobre os assuntos trabalhados nos projetos que estão sendo realizados nas áreas de História, Geografia e Ciências. No outro, há algumas listas- dos livros emprestados, dos ajudantes do dia, das brincadeiras que as crianças conhecem e que são escolhidas na hora do recreio- cartazes da comunidade, notícias do jornal da cidade trazidos por Ana ou pelas crianças, um mapa – mundi e um mapa do Brasil (que vieram de encarte numa revista educativa) e recadinhos que as crianças dos dois períodos deixam umas para outras.
Também existe, na sala de aula, um canto com diversos materiais de leitura: livros de histórias, piadas, adivinhações, poemas, jogos, cadernos de receitas, gibis, catálogos de livros, folhetos de lojas e uma lista telefônica... Não são muitos, mas hoje a preocupação de Ana não é mais a quantidade de coisas para ler, mas a qualidade dos textos.
A maioria desses materiais de leitura foi conseguida porque ela e as crianças escreveram para uma amiga sua, que mora na capital, pedindo que os comprasse num sebo, com o dinheiro obtido em várias arrecadações feitas na escola para essa finalidade. A princípio, não sabia exatamente quais livros comprar, mas uma outra amiga, que é coordenadora pedagógica, trouxe-lhe uma relação em que havia várias sugestões de títulos e, juntas, fizeram uma seleção. Ana conversou com as crianças sobre os livros que pretendia comprar e elas também colaboraram dando algumas idéias. Esses livros tem sido muito importante, não só para as crianças como também para ela: ao lê-los diariamente, começou a descobrir os encantos da literatura infantil, o que não pôde desfrutar quando criança.
Na sala, tem também atlas e um dicionário(desses que alguns jornais deram de brinde aos leitores tempos atrás, e que são de boa qualidade): acabaram-se os apuros por falta de um dicionário para consulta, o que aconteceu várias vezes em anos anteriores.
Infelizmente ainda não há livros suficientes para emprestar a todas as crianças ao mesmo tempo, por isso, em todas as reuniões de pais, Ana tem procurado incentivá-los bastante a contar história para seus filhos, mesmo quando estão ocupados com os afazeres domésticos. Ela conseguiu vários adeptos e, uma vez por semana, as crianças contam histórias para os colegas: segundo ela, muitas são bem engraçadas e há uma grande quantidade de “causos” que fazem o maior sucesso.
Com o tempo, Ana convenceu-se da importância de aproveitar todas as situações em que é necessário escrever na classe e em que isso pode ser feito junto com as crianças para produzirem coletivamente os textos. Já não escreve mais sozinha, como fazia anteriormente, os recados para os pais, os cartazes de aviso para a turma do outro período, as anotações sobre atividades pendentes, a lista de atividades e materiais necessários para os projetos de trabalho, o registro do que se faz para socializar com a crianças que faltaram, os roteiros de entrevistas ou pesquisas dirigidas aos pais ou outras pessoas, os convites, cartazes ou cartões para datas especiais...Descobriu que, dessa forma, além de ficar explícita a função social da escrita, as crianças podem produzir textos desde pequenos, mesmo sem ter que pegar lápis!
Nesse processo, Ana foi enxergando a competência das crianças e tomando-as como parceiras para a produção de textos não só necessários no cotidiano escolar, mas de outros, muito mais elaborados. Chegaram a produzir um livro de brincadeiras para a própria classe e para as crianças de uma outra escola e agora estão pensando em documentar os causos contados pelas famílias...Essas situações tem contribuído para que Ana compreenda a importância do planejamento da escrita, do rascunho, do tempo necessário para escrever e da revisão dos textos produzidos.
Ela tem ficado satisfeita com a participação ativa das crianças nessas situações de uso real da escrita, que são situações significativas de letramento. Porém, o que a tem deixado intrigada é que muitas de suas crianças mais espertas ainda não escrevem alfabeticamente, a despeito de tudo que vem sendo feito na sala de aula. Ana sabe que o objetivo maior na Educação Infantil não é alfabetizar as crianças e que nem todas aprenderão a ler e escrever convencionalmente na pré-escola... mas, considerando o trabalho que está sendo feito e a competência que elas possuem, fica com sensação de que deve haver algo errado com a proposta pedagógica, pois tem certeza de que, mesmo sem estarem necessariamente alfabetizadas, todas poderiam ter aprendido muito mais sobre a escrita do que de fato aprenderam.

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